Política externa está à margem dos interesses nacionais

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Prevista para amanhã, a viagem do presidente Jair Bolsonaro a Israel é relevante porque deverá expor contradições de um projeto de política externa claramente incoerente nos fundamentos com os interesses do Estado brasileiro.

A principal motivação da visita presidencial é a opção pelo alinhamento mecânico à agenda de Donald Trump no Oriente Médio. Não se cuidou de analisar as implicações nem mesmo nas relações com as nações árabes e o Irã, compradores de metade da proteína animal produzida no Brasil.

Além de condicionar a diplomacia brasileira à lista de necessidades da Casa Branca, a viagem tem a conveniência política de reforçar laços com frações do ativismo neopentecostal e do ultraconservadorismo judaico, aliados eleitorais de Bolsonaro.

Tudo isso sob uma insólita concepção de Estado que o chanceler Ernesto Araújo tentou traduzir em Washington, há duas semanas. “Quando os cidadãos olham e enxergam apenas o Estado, isso não os transforma” — disse, no seu esforço de dar sentido lógico à atual política externa. “Porque o Estado não gera sentimentos” — continuou—, “e o ser humano é movido por sentimentos. Mas quando olham e enxergam a nação, surge um potencial incrível de criar energia e de unificar o país.”

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Arrematou lembrando o slogan eleitoral de Bolsonaro: “‘Deus acima de todos’. Aqui se introduz a concepção de uma realidade vertical, onde o ser humano sabe que possui uma dimensão espiritual e onde a vida não se reduz às leis da física. Com esse lema, o presidente está reconfigurando a realidade brasileira. Com apenas oito palavras está enfrentando o sistema. Um sistema que produziu, por exemplo, uma relação de indiferença ou de hostilidade para com os Estados Unidos”.

Seria uma formulação cômica se não tivesse o caráter de anúncio de quem governa um país regido por Constituição laica, independente de fé religiosa. A ideia de transferência da Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém, por exemplo, confronta diretamente esse fundamento laicista da Carta, sem que seja possível indicar serventia a um só interesse nacional concreto.

Ao contrário, desde o enunciado rompe-se um compromisso de ponderação e equidistância preservado desde 1947, quando Oswaldo Aranha presidiu a sessão da ONU que levou à criação do Estado de Israel e de um Estado árabe, ainda inexistente.

Bolsonaro deveria visitar um símbolo desse legado de ponderação e equidistância, que ameaça destruir. No centro de Jerusalém há uma praça chamada Oswaldo Aranha. Fica próxima ao cemitério muçulmano.



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