O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, teria convencido procuradores da Operação Lava Jato a não pedirem a apreensão dos celulares do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (MDB-RJ), um dia antes de sua prisão. É o que indicam os novos vazamentos de supostos diálogos entre o então juiz federal e procuradores da força-tarefa.
Moro teria orientado a não apreensão em uma conversa com o procurador Deltan Dallagnol no dia 18 de outubro de 2016. Os vazamentos foram divulgados pelo BuzzFeed.news, em parceria com o The Intercept Brasil, com base em mensagens enviadas por fonte anônima.
Na véspera da prisão de Cunha, o diálogo entre Deltan e Moro teria sido:
- 11:45:25 Deltan: Um assunto mais urgente é sobre a prisão
- 11:45:45 Deltan: Falaremos disso amanhã tarde
- 11:46:44 Deltan: Mas amanhã não é a prisão?
- 11:46:51 Deltan: Creio que PF está programando
- 11:46:59 Deltan: Queríamos falar sobre apreensão dos celulares
- 11:47:03 [Moro]: Parece que sim.
- 11:47:07 Deltan: Consideramos importante
- 11:47:13 Deltan: Teríamos que pedir hoje
- 11:47:15 [Moro:] Acho que não é uma boa
Dallagnol teria tentado, então, marcar um encontro com o ex-juiz para discutir a questão pessoalmente:
- 11:47:27 Deltan: Mas gostaríamos de explicar razões
- 11:47:56 Deltan: Há alguns outros assuntos, mas este é o mais urgente
- 11:48:02 [Moro]: bem eu fico aqui até 1230, depois volto às 1400.
- 11:48:49 Deltan: Ok. Tentarei ir antes de 12.30, mas confirmo em seguida de consigo sair até 12h para chegar até 12.15
- 12:05:02 Deltan: Indo
Mais tarde, por volta das 14h15, o procurador da força-tarefa informa Moro de que a decisão de não apreender os aparelhos foi tomada:
- 14:16:39 Deltan: Cnversamos [Conversamos] aqui e entendemos que não é caso de pedir os celulares, pelos riscos, com base em suas ponderações
- 14:21:29 [Moro]: Ok tb
No dia 19 de outubro Eduardo Cunha foi preso pela força-tarefa e levado a um presídio em Curitiba, mas não teve os celulares apreendidos. O deputado havia entregado alguns aparelhos à Justiça em uma operação anterior, em 2015, mas os novos equipamentos não foram confiscados.
O que dizem os citados
Em resposta ao BuzzFeed, o ministro Sergio Moro respondeu, por meio de nota, que não reconhece a autenticidade das mensagens e que os celulares de Cunha haviam sido apreendidos anteriormente pela Justiça.
“O Ministro da Justiça e da Segurança Pública não reconhece a autenticidade das mensagens obtidas por meio criminoso, nem sequer vislumbrou seu nome como interlocutor nas mensagens enviadas pelo BuzzFeed. Em relação aos aparelhos celulares do ex-Deputado Eduardo Cunha, como foi amplamente divulgado pela imprensa, eles foram apreendidos por ordem do STF na Ação cautelar 4044, antes da prisão preventiva.”
Já a Lava Jato afirmou que o material, além de conseguido através crime cibernético, estava sendo manipulado e usado fora de contexto.
“A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas a seus integrantes nas últimas semanas. O material é oriundo de crime cibernético e tem sido usado, editado ou fora de contexto, para embasar acusações e distorções que não correspondem à realidade. A análise da busca e apreensão de itens toma em conta diferentes fatores, inclusive a perspectiva de efetividade para as investigações. No caso do ex-presidente da Câmara, seus celulares já tinham sido apreendidos por ordem do Supremo Tribunal Federal.”
Entenda os vazamentos
Desde o dia 09 de junho, o Intercept vem revelando uma série de conversas privadas que mostram Moro e procuradores, principalmente Deltan Dallagnol, combinando estratégias de investigação e de comunicação com a imprensa no âmbito da Operação Lava Jato.
Segundo as revelações, o ex-juiz sugeriu mudanças nas ordens das operações, antecipou ao menos uma decisão e deu pistas informais de investigações nos casos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O site é de Glenn Greenwald, um jornalista americano vencedor do prêmio Pulitzer por ter revelado, em 2013, um sistema de espionagem em massa dos EUA com base em dados vazados por Edward Snowden.
Como as revelações vieram a público por uma reportagem, ainda será necessária uma extensa investigação, provavelmente conduzida pela Polícia Federal, para confirmar as implicações jurídicas.
O vazamento de informações sigilosas no âmbito da Lava Jato tem sido comum desde o início da operação em 2014.
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