São Paulo – O Ministério Público Federal (MPF) da Bahia determinou ontem que escolas públicas militarizadas não mais interfiram em corte de cabelo, cor de unhas e maquiagem de estudantes ou os impeçam de namorar e se manifestar politicamente. O modelo tem crescido e faz com que uma escola municipal ou estadual passe a ter administração compartilhada entre a secretaria da Educação local e a Polícia Militar. A ideia é semelhante ao que o governo Jair Bolsonaro anunciou este mês como prioridade para o Ministério da Educação (MEC).
Para o MPF, elas têm visão “autoritária” e restringem a liberdade de expressão. Segundo o MEC, há 203 escolas chamadas pelo governo federal de
co-militares no Brasil, em 23 Estados e no Distrito Federal, com 192 mil alunos.
O MEC pretende investir R$ 40 milhões para implementar 108 dessas escolas até 2023, com 100 mil alunos, segundo foi anunciado este mês. Como mais uma forma de estímulo, nesta semana o presidente Bolsonaro assinou decreto que permite que policiais militares trabalhem em escolas públicas. E afirmou que investir em educação é investir na “autoridade do professor”. Procurada, a assessoria do MEC informou que o projeto de escolas cívico-militares, em elaboração, será divulgado até o fim do ano.
O modelo é diferente das escolas do Exército, que são 13 no País, e têm a função de formar quadros militares. Nelas, segundo indicadores do MEC, os alunos têm renda alta, passam por seleção e apresentam desempenho melhor. O custo de um aluno em escolas do Exército, que têm piscina, laboratórios de robótica e professores com salários de R$ 10 mil, é três vezes maior que o de uma escola pública comum. As escolas cívico-militares também não são como os colégios da Polícia Militar, que existem em alguns Estados, e são totalmente geridos pela PM. “As escolas públicas são para comunidade geral, não se pode suprimir as individualidades. Os alunos necessariamente não querem ser militares, podem querer ser artistas, por exemplo”, diz o procurador do MPF-BA Gabriel Pimenta.
Os regimentos de algumas escolas proíbem até que os alunos frequentem locais de jogos eletrônicos, usem óculos esportivos e namorem, se estiverem usando uniforme. Há também registros de controle das redes sociais dos estudantes e do tipo de publicação que eles levam para a escola. Segundo o documento do órgão, com essas proibições, as escolas violam a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente e as convenções internacionais que “preveem educação com base no pluralismo, tolerância, direitos humanos, valorização de diversos saberes”. “Desconheço estudos e educadores que achem que penteado e cor de esmalte de um aluno vão interferir na qualidade do ensino”, completa o procurador. A recomendação atinge escolas baianas apenas, mas é a primeira manifestação do MPF sobre o assunto.
Presidente executiva do Movimento Todos Pela Educação, Priscila Cruz observa que “uma política educacional, com recursos da Educação, que serve para impor um tipo de comportamento desejado por um grupo qualquer, é, no limite, desvio”. “É como usar recursos da Educação para construir uma ponte que traz benefício eleitoral ou de imagem.” Como o modelo é recente, não há estudos conclusivos mostrando melhor desempenho de escolas militarizadas. O MEC já fez uma apresentação em que dizia que escolas cívico-militares tinham Ideb (principal índice de qualidade de ensino do País) superior às escolas públicas civis. Questionado pelo Estado, não soube explicar como calcularam os dados.
Goiás
Em geral, a justificativa da gestão compartilhada com a PM é a de trazer mais segurança e disciplina. Em Goiás, já há 60 escolas estaduais militarizadas. Elas têm fila de espera e as vagas são decididas por sorteio. Entre as regras, há a proibição de “mascar chiclete”, “sentar-se no chão estando uniformizado” ou “usar óculos com lentes ou armações de cores esdrúxulas, mesmo sendo de grau”.
Na Bahia, a mudança começou em 2018 e já são 63 escolas em 58 cidades. Os órgãos oficiais têm até 15 dias para informar as medidas adotadas para o cumprimento da recomendação feita.
Procurado pelo Estado, o governo da Bahia disse que não se manifestaria porque ainda não foi notificado. Caso a decisão não seja cumprida, o modelo pode ser questionado na Justiça, segundo o MPF. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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