São Paulo — Apesar de ter assumido o posto de ministro da Educação com o objetivo declarado de “acalmar os ânimos” na pasta, o economista Abraham Weintrau vem anunciando uma série de alterações nas universidades federais do país.
Nas últimas duas semanas, o chefe do MEC determinou a redução no repasse de verbas para cursos de filosofia e sociologia e afirmou que cortaria o investimento em faculdades que praticassem o que chama de “balbúrdia”.
Depois, voltou atrás e anunciou um contingenciamento de 30% do orçamento para todas as 63 faculdades federais que funcionam hoje no Brasil.
Com um discurso de que é preciso respeitar “os pagadores de impostos”, Weintrau definiu o bloqueio de 5,8 bilhões de reais do orçamento do MEC para as faculdades. De acordo com o presidente Jair Bolsonaro, esse valor será revertido para investimentos na educação básica.
Todas essas medidas estabelecidas pelo ministro do MEC, contudo, têm sido questionadas por descumprirem a legislação brasileira.
Quando o Executivo diz que vai escolher quais serão os cursos que receberão mais ou menos dinheiro, ele estaria ferindo a autonomia das universidades, um princípio estabelecido na Constituição Federal de 1988.
No artigo 207, está determinado que “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.
“Se o governo entende que há dificuldades financeiras é necessário conversar com os reitores das universidades para analisar de quais maneira se pode estabelecer outras metas. Não é permitido, no entanto, cortar linearmente o recurso e muito menos baseado em uma motivação vaga e inespecífica”, diz Nina Ranieri, coordenadora da Cátedra UNESCO de Direito à Educação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).
Quando determina cortes sem especificar uma motivação ou critério claro, e sim ideológico, o governo também estaria infringindo a Lei do Procedimento Administrativo (Lei nº 9.784/99), que estabelece a obrigação de que todas as ações do Executivo sejam acompanhadas de justificativas técnicas, como um estudo.
“Qualquer corte de recursos do Executivo precisa ser justificado com fatos e não deve ser arbitrário. Com uma motivação equivocada, isso pode vir a ser questionado na Justiça e trazer mais problemas para a administração pública”, explica Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação do governo de Dilma Rousseff.
Mesmo sem interferir diretamente nas universidades, no entanto, o MEC tem outras prerrogativas que o permitem influenciar na sua gestão, já que o chefe da pasta é o responsável por escolher os reitores.
“É o governo que nomeia o dirigente, com base em uma lista tríplice. Não é necessário conduzir dessa forma as mudanças”, conclui Ranieri.
Mobilização das federais
O contingenciamento de 30% das verbas das universidades federais preocupa os reitores, que têm dado declarações públicas sobre os problemas que enfrentarão daqui para a frente.
Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, reitor da Universidade Federal Fluminense (UFF), diz que com “esse corte vamos, mal, só pagar conta. E tem de sobrar para pagar água e luz. Se não, nem abro a porta”, disse.
Em nota, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a mais antiga do país, anunciou que pode fechar as portas sem o dinheiro. “Se esta medida não for revertida, as consequências serão graves para o desempenho das atividades da UFPR no segundo semestre de 2019″.
O vice-presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), João Carlos Salles, afirma que será preciso diálogo com o MEC para reverter essa realidade.
“O ensino superior é patrimônio da sociedade, ele não pode ser contraposto com a educação básica: não há educação de qualidade sem professores de qualidade”, afirmou.
Salles, que também é reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), defende que haja uma defesa da importância das faculdades públicas para o desenvolvimento social do Brasil.