Com os rostos cobertos por ataduras — indicações claras de um ferimento —, duas mulheres velam um morto no centro da sala. Em determinado momento, surge o aviso: “Aqui você pode chorar pelo seu irmão, pelo seu pai, pela sua mãe, pelo seu país”. A situação inusitada — uma espécie de contemplação fúnebre coletiva — é o disparador do espetáculo que é uma espécie de instalação performática “Caixa preta”, em cartaz desde a última sexta-feira no Teatro III do CCBB, no Centro
(confira a programação atualizada de teatro no Rio)
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![[Tags] xcaixa-preta-ccbb.jpg.pagespeed.ic.PNd5ETi9TF Performance 'Caixa preta', no CCBB, aborda o luto](https://ogimg.infoglobo.com.br/rioshow/23546506-7fb-e2b/FT450A/xcaixa-preta-ccbb.jpg.pagespeed.ic.PNd5ETi9TF.jpg)
A montagem idealizada pelo argentino Fernando Rubio, com as atrizes Giulia Grandis e Ludmila Wischansky (e o auxílio de um boneco hiper-realista), lança mão de poesia e filosofia para abordar tabus normalmente associados à morte e ao luto. A narrativa dramatúrgica irreverente reforça questões que não despontam necessariamente por meio da palavra, como reforça o diretor, conhecido por conceber espetáculos em formatos semelhantes — no último ano, também no CCBB, ele apresentou “Yo no muero, ya no más”, em que um elenco reproduzia cenas de agressões contra mulheres dentro de uma grande caixa de vidro, a partir de relatos escritos por quem assistia.
— Desta vez, há muitas passagens que podem surpreender ou impactar. Construímos um espaço dedicado ao luto coletivo, para expurgarmos tristezas e choros que pertencem a todos. O espectador tem direito de sair e entrar da sala quando bem entender, e isso já é uma provocação: como público, quem somos? Mas o nosso grande interesse está nas reflexões mais sutis — destaca Rubio. — A gente se acostumou a olhar a morte nos jornais, na TV… Somos domesticados para que isso seja algo aparentemente normal.