A cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia que a fala do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) sobre um novo “AI-5” é uma opinião que está protegida pela imunidade parlamentar, segundo o Estado/Broadcast Político apurou. A polêmica declaração reacendeu dentro da PGR, do Supremo Tribunal Federal (STF) e de tribunais superiores o debate sobre a extensão da imunidade parlamentar e a possibilidade de o parlamentar responder na Justiça pelo seu posicionamento.
Segundo a Constituição, os congressistas são “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Isso não significa, porém, que tudo é permitido pela Justiça. Em junho de 2016, por exemplo, a Primeira Turma do STF aceitou denúncia contra o então deputado federal Jair Bolsonaro por dizer, nos corredores da Câmara, que a petista Maria do Rosário (RS) não “merecia ser estuprada” por ser “muito feia” e porque ela “não faz seu tipo”.
A avaliação do colegiado na época foi a de que as declarações não guardam relação com a função de deputado, não devendo ser protegidas pela imunidade parlamentar. A ação foi suspensa depois que Bolsonaro assumiu o Palácio do Planalto, já que o presidente não pode ser responsabilizado por ato anterior ao mandato.
Dois integrantes da cúpula da PGR ouvidos reservadamente pelo Estado/Broadcast Político avaliam que a declaração de Eduardo Bolsonaro está protegida pela imunidade parlamentar. Um deles define o posicionamento do filho do presidente da República como “simples opinião”. Um outro membro da cúpula da PGR diz que acionar, hoje, a Justiça contra Eduardo Bolsonaro equivale a reprimir quem falava contra o AI-5 nos anos de chumbo. “Quem fala o que quer, ouve o que não quer. Essa é a regra da liberdade”, afirmou.
Dentro do STF, no entanto, um ministro acredita que a fala representa um ataque à democracia, representa uma ameaça ao Estado de Direito e pode ser enquadrada até na lei de segurança nacional. Sancionada em 1983, em plena ditadura militar, a lei prevê detenção de um a quatro anos para quem fazer, em público, propaganda de “processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social”.
Em entrevista ao Estado/Broadcast Político, o ministro Marco Aurélio Mello considerou o comentário de Eduardo Bolsonaro uma “impropriedade”. “Estão solapando a democracia. E é geral. Exemplo: o inquérito natimorto: sigiloso ao extremo e nele tudo cabe. Aonde vamos parar?”, disse Marco Aurélio à reportagem, ao criticar o inquérito sigiloso instaurado pelo próprio STF para apurar ameaças, ofensas e fake news contra integrantes da Corte.
Um outro integrante do Supremo, que também pediu para não ser identificado, concorda com a posição da cúpula PGR de que as falas estão protegidas pela liberdade de expressão e a imunidade parlamentar. Para esse integrante, muitas pessoas defendem o regime militar, e “não há como enquadrar ideias”.
Precedentes
A extensão da imunidade parlamentar é um tema recorrente em julgamentos no STF. Em 2014, a Primeira Turma do STF recebeu denúncia contra o então deputado Abelardo Camarinha (PSB-SP) por injúria, depois que ele deu entrevista em que acusava um vereador de ter adquirido bens com dinheiro de origem ilícita. “A atividade parlamentar tem no uso da palavra sua expressão mais significativa, mas o abuso da palavra pode ter, sim, implicações criminais civis e criminais”, disse a ministra Rosa Weber na ocasião.
Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde também atua, Rosa ainda não se manifestou sobre a controversa declaração de Eduardo Bolsonaro. Para um ministro do TSE, Eduardo não infringiu nem ofendeu ninguém e nenhuma instituição, e sim “falou bobagem”.
Já um ministro do Superior Tribunal e Justiça (STJ) respondeu ao questionamento da reportagem com outra pergunta: “A questão é: pode um parlamentar usar a imunidade parlamentar, atributo da democracia, para defender a ditadura?”
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