Os estudos do governo de conceder benesses ao Ministério da Defesa em detrimento a mais recursos para o Ministério da Educação no Orçamento de 2021 causou alarde — e com razão. Como mostra reportagem de VEJA, o presidente Jair Bolsonaro determinou a destinação de 107,9 bilhões de reais para a pasta comandada pelo general Fernando Azevedo e Silva, ante os 102,9 bilhões de reais à disposição do ministro da Educação, Milton Ribeiro — o valor, inclusive, é menos do que o empenhado pelo governo federal neste ano. A destinação maior para a Defesa prova o inchaço do Estado, já que quase 90 bilhões de reais deverão ser destinados ao pagamento de funcionários do Ministério da Defesa. Toda essa equação está nas mãos do senador Márcio Bittar (MDB-AC). Escolhido relator do Orçamento para o ano que vem, o parlamentar se diz alinhado à política econômica do ministro da Economia, Paulo Guedes, mas afirma que as aspirações por aumentar gastos em obras de infraestrutura, o que provocou ruídos entre a equipe econômica e a ala desenvolvimentista do governo, são legítimas. Para o senador, o desafio de bancar um programa de renda básica está nas mãos de Guedes e diz, “em tese”, não ver problema no aumento de recursos para a Defesa e a diminuição da verba para o Ministério da Educação.
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O governo estuda conceder aumento ao Orçamento da Defesa e diminuição dos recursos para a Educação. Como o relatório do senhor deve tratar essa questão? Na educação, o que falta não é dinheiro. Mesmo a verba federal carimbada sendo 18%, o que ela está entregando em detrimento ao que recebe é uma vergonha nacional – aliás, uma vergonha internacional. Sou casado com uma professora, tenho três irmãs professoras universitárias. Aquilo é uma vergonha. O que custa um aluno da universidade pública brasileira é uma loucura. A educação está na UTI, temos uma péssima educação desde a alfabetização. Aqui não tem época para alfabetizar aluno. Lembro de um secretário municipal de uma capital que não vou citar o nome, que cuida de ensino primário, de criança, dizendo em uma entrevista que a escola é um ambiente para discutir política, democracia, opção sexual, segurança. Pensei: “Eu sou um louco”. Estou me balizando na ideia de que era para o cara aprender português, matemática, ser alfabetizado. Politizaram o ambiente, e o dinheiro para a educação foi de 4% para 6,2% do PIB e o nível da educação não acompanhou.
Não falta investimento na educação no Brasil? O que está faltando para a educação não é recurso. Se você pegar os indicadores de educação no Brasil e comparar com o de outros países – compare com a Índia, compare com a China –, você vai ver que a Índia gasta menos que o Brasil e está muito melhor. Nós temos um problema gravíssimo na educação, e não é falta de dinheiro. A partir daí, surgiu esse assunto, porque está visto de que, tudo que nós aprovamos, está faltando chegar na ponta 20 bilhões de reais e, pelo o que eu tenho ouvido, não vai chegar. Sobrariam uns 10 bilhões de reais. O que fazer com esse dinheiro? Pensamos em ir um pouco para a segurança.
E para a Defesa, é necessário aumentar os recursos? Eu não sei, isso é tudo especulação, não chegou em mim ainda. Estou dizendo que, a princípio, a Defesa precisa de mais recursos para defender as fronteiras do Brasil. É possível combater com mais eficiência a entrada de drogas e armamento pesado na fronteira amazônica com recursos que temos? Não. Por enquanto, isso é especulação. Te respondo em tese. Aplicar parte dos recursos destinados ao combate da Covid-19 na segurança do Brasil, em tese, não está errado.
Por quê? A área de segurança é outro flagelo no Brasil, e é quase impossível melhorá-la sem mais recursos. Sou paulista de nascimento, mas represento o Acre com muito orgulho. Pegue meu estado: você tem 7 mil quilômetros de fronteira seca. Tem lugar longe para burro na região amazônica, que você só chega de barco, numa comunidadezinha de três ou quatro casas e olha do outro lado do morro, já é o Peru. O que tem de segurança? Nada. Somos o primeiro e segundo país do mundo que mais consome crack e cocaína. O que entra de droga e armamento naquela região chega em São Paulo, no Rio de Janeiro, nos grandes centros urbanos do país.
Como o governo vai bancar a continuidade de um programa de renda básica? Não dá para terminar o ano com o auxílio emergencial e não conceder nada a partir de janeiro. Sou pai de família, de quatro filhas, casado há 32 anos. É assim: reúne a família e fala: “Olha, esse ano está difícil, vamos cortar isso e aquilo”. O presidente quer criar um programa para continuar dando amparo a milhões de brasileiros que não têm como sobreviver sem isso. Ele quer manter um programa de obras estruturantes nas regiões mais pobres porque o setor privado não tem interesse. Qual a tarefa do ministro Paulo Guedes? Buscar as fontes, encontrar onde ele pode diminuir as despesas para impedir que não saiamos da linha.
E quais os entraves no Congresso Nacional para encampar esse projeto? É muito fácil aprovar o Renda Brasil no Congresso, mas pautas de austeridade são mais complicadas de andar, embora publicamente todos digam que precisamos ser mais responsáveis e que o Estado gasta demais comparativamente ao que entrega. Veja a votação aqui no Senado: um monte de parlamentar sequestrado por uma visão, que considero equivocada, que servidor público pode pedir aumento neste momento. A agenda de austeridade enfrenta barreiras. Qual o perigo? Ao encampar programas importantes e legítimos, cria-se uma alegria que pode virar um pesadelo nos próximos anos.
A ideia é o ministro conseguir manter o teto de gastos, é diminuir o ‘piso”, ou seja, reduzir o repasse a ministérios e a aposta na PEC Emergencial. Há ambiente para isso no Parlamento? Tenho que manter o equilíbrio, ouvir todo mundo, e fazer o melhor relatório possível, tanto da PEC 188 [do Pacto Federativo] e do Orçamento. Fui indicado pelo senador Eduardo Braga (MDB-TO) [líder do governo no Congresso] para ir à Comissão e o presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP) me nomeou. Esses dois são diretamente responsáveis por eu ter me tornado o relator do Orçamento. Eles sabiam, desde o começo, que sou alinhado à política econômica do governo. Estive na pré-campanha do Bolsonaro, porque percebi ao longo do período que ele caminhava rumo a uma política econômica mais liberal, muito por causa do Paulo Guedes. Então, o governo tem um aliado programático, mas que também sabe que o Congresso e governadores e prefeitos têm pleitos legítimos. O governo e o presidente têm legitimidade de perceber que, ao terminar o ano com o auxílio emergencial, existem quase 10 milhões de vulneráveis. A fila do desemprego aumentou. O que você faz com essa turma a partir de janeiro? Abandona? Não tem como. Então, temos que abraçá-los com o Renda Brasil.
As aspirações de se gastar em obras é legítima neste momento? A princípio, não está errado você pegar 10 bilhões de reais que sobraram de uma coisa e jogar um pouco em obras estruturantes para Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O Norte e o Nordeste são as regiões mais pobres do Brasil precisam de obras estruturantes que o setor privado não tem recurso ou interesse em fazer, precisa ser por meio do Estado, senão você não tira essas regiões do marasmo econômico. É legítimo que o governo queira continuar obras, mas como faz isso sem trair o ideário que te elegeu? O ministro Guedes tem a tarefa de ver como pode ser feito sem essa traição ao ideário. Cabe ao ministro estudar. Tem fundos criados, como o da Desestatização, do PIS, do Pasep, do combate à fome. Tem esse dinheiro para ser usado. A PEC do Pacto Federativo está pronta e aponta para a austeridade fiscal, repassando recursos com transparência e direcionando os recursos, que estabelece uma série de coisas que vão nesta direção. O Pacto já é um direcionamento a favor da responsabilidade fiscal, junto com a PEC dos Gatilhos, que diz que se os entes atingirem o teto, não pode aumentar despesas. Não podemos fazer uma coisa só. Se apenas aumentarmos despesa, por mais que seja legítima a aspiração, e o que fazer com esses recursos, estaríamos saindo da trilha proposta na campanha, e que está dando certo. Precisamos caminhar nesta direção: atingir a aspiração legítima do presidente, mas apontar pela diminuição dos gastos do Estado brasileiro.
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