O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, confirmou nesta quinta-feira, 25, que o presidente Jair Bolsonaro viajará à China em outubro. Como contrapartida, o presidente chinês Xi Jinping virá ao Brasil em novembro, quando o país sediará a Cúpula do Brics, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Araújo se reuniu nesta manhã com o conselheiro de Estado e ministro dos Negócios Estrangeiros da China, Wang Yi, para a 3ª reunião do Diálogo Estratégico Global Brasil-China.
Na declaração à imprensa realizada após o encontro, o ministro disse que a conversa girou em torno da melhoria da cooperação econômica, agrícola, industrial, tecnológica e turística com os chineses.
“Falamos do momento que os dois países vivem. O Brasil quer ter cada vez mais uma relação econômica aberta com o mundo e a China é um importante parceiro comercial. Discutimos as maneiras de aumentar o intercâmbio econômico entre os dois países e há um interesse recíproco de se ter mais investimentos chineses no país”, disse.
Segundo Araújo, há um interesse em ampliar a vinda de turistas chineses ao Brasil e uma das medidas em análise é a emissão mais rápida do visto para eles.
Analistas esperam que pragmatismo prevaleça
O ministro brasileiro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, já deixou claro que não é exatamente um apaixonado por Pequim. Quando se reunir com seu equivalente chinês pela primeira vez, nesta quinta-feira (25), analistas esperam, porém, que o pragmatismo saia ganhando.
Crítico da China e admirador fervoroso do presidente americano, Donald Trump, Araújo deve adotar um tom mais conciliador quando se reunir com o ministro Wang Yi em Brasília, à margem de um encontro mais amplo com os demais colegas do Brics – Rússia, Índia e África do Sul.
Os dois lados querem fortalecer uma relação que, há poucos meses, parecia estar sob risco, após as eleições de Jair Bolsonaro, especialmente com o aprofundamento das tensões comerciais EUA-China.
O professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas Oliver Stuenkel explica que a ala do governo liderada pelo vice-presidente Hamilton Mourão conseguiu convencer setores mais radicais à direita, como o próprio Araújo, de que “há coisas demais em jogo” para o Brasil se afastar de seu maior parceiro comercial.
A China representou 27,8% das exportações brasileiras em 2018.
“As perspectivas econômicas do Brasil dependem de bons laços econômicos com a China”, disse Stuenkel à AFP.
“Tenho confiança de que, paradoxalmente, as relações entre China e Brasil vão se aprofundar no governo Bolsonaro”, completou.
A maior aproximação da China teve início durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, mas, durante a campanha eleitoral do ano passado, Bolsonaro acusou o país asiático de estar “comprando o Brasil”.
Desde que assumiu a Presidência, Bolsonaro optou por se aproximar de países governados por líderes, com os quais tem maior alinhamento ideológico, como Estados Unidos e Israel, enquanto se afastou de países em desenvolvimento.
Mas a desaceleração econômica do país e a forte pressão dos setores do agronegócio e da mineração – que dependem da China para exportar soja e minério de ferro – transformaram essa relação.
“Tem uma retórica ideológica, mas, na prática, o pragmatismo prevalece”, opinou Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington. “Você não deve se ater ao que foi dito alguns meses atrás sobre política externa e meio ambiente. Mudou completamente”, disse o diplomata à AFP.
Mourão teve de se esforçar para reparar os danos na relação com a potência asiática. Ele viajou para Pequim em maio, onde reforçou ao presidente Xi Jinping o interesse do Brasil nos investimentos chineses.
Neste mês, o vice-presidente disse que a companhia chinesa Huawei não enfrentaria restrições no Brasil, desafiando a pressão americana para cortar os laços com a empresa tecnológica – acusada de ser ligada ao governo e de espionagem.
“Há tensões no governo sobre como lidar com a China”, detalhou Luis Fernandes, do BRICS Policy Center, da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio). Mas “tendo a achar que os interesses econômicos vão sobressair”.
Embora Pequim tenha notado a retórica anti-China do novo governo, Julia Coym, da consultoria Control Risks, de Xangai, acredita que o país asiático não vai retaliar. “A China vai prestar muito mais atenção às ações do Bolsonaro agora que ele está na Presidência do que à retórica que ele adotou durante a campanha”, afirmou a especialista.
Atritos no Brics
Após o encontro em Brasília, Araújo e Wang encontrarão seus colegas do Brics no Rio para uma reunião que antecede uma cúpula na capital federal, em novembro.
Espera-se que a situação da Venezuela esteja na pauta, mas, com as profundas divisões internas no clube das economias emergentes sobre esta questão, é improvável que seja feita uma declaração contundente acerca do tema.
O Brasil está entre os 50 países que reconheceram o opositor Juan Guaidó presidente interino. China e Rússia apoiam o governo de Nicolás Maduro.
“Isso pode começar a ser um elemento para aumentar os atritos entre os (membros do) Brics”, opinou Carlos Gustavo Poggio, da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).
Alguns analistas acreditam que a ligação de Brasil e China é a principal razão para o país continuar no Brics – embora a relevância do grupo tenha sido questionada nos últimos anos.
“Se o Brasil fosse sair abruptamente, acho que isso criaria uma crise desnecessária com Pequim”, afirmou Brian Winter, editor-chefe da “Americas Quarterly”.
“Eles querem manter uma relação comercial pragmática com a China”, que vê no Brics uma boa forma de expandir sua influência na América Latina e na África, acrescentou.
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