São pelo menos dois anos de crises consecutivas pesando na cabeça de Mark Zuckerberg. Vazamento de dados, ataques de hackers que permitiram invasão de contas, questões graves de privacidade e segurança das informações do público… tudo isso mudou demais a forma como o Facebook, que um dia foi só um site divertido para interagir com seus amigos, é encarado pela sociedade. Quantas vezes a empresa já não foi chamada de “ameaça à democracia”? Até mesmo a companhia já chegou a admitir o risco das redes sociais aos regimes democráticos.
No entanto, o Facebook é muito mais do que sua rede social homônima. A empresa é dona de outros aplicativos gigantescos e que, por sorte da companhia, ainda não tiveram a reputação tão manchada. É o caso do WhatsApp e do Instagram, que se juntaram ao conglomerado após serem adquiridos por bilhões de dólares, mas que, até pouco tempo atrás, se mantinham teoricamente semi-independentes, ao menos no papel e na nomenclatura.
Isso começou a mudar, no entanto. Se há algum tempo não havia qualquer menção a Facebook dentro do WhatsApp ou do Instagram, agora se você olhar a descrição dos aplicativos nas lojas da Apple e do Google, você vai encontrar a informação de que os apps são parte do Facebook.
Mas por que essa decisão neste momento? A tendência é que se trate de uma jogada de marketing para tentar agregar a boa vontade do público com Instagram e WhatsApp ao Facebook, que hoje se vê envolto em todo tipo de escândalos que seus outros apps ainda tem uma reputação limpa, como explica Arthur Igreja, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e especialista em tecnologia e inovação.
É um momento diferente na história do Facebook. Como cita Igreja, por muitos anos as marcas se mantiveram parcialmente distantes, até como uma estratégia da própria companhia diante de questões jurídicas. “O Facebook tinha algumas acusações de que as compras foram feitas para bloquear a concorrência, então por isso havia uma tentativa de manter a aparência de um grupo empresarial” explica o professor em entrevista ao Olhar Digital. Essa união não é muito diferente do que já se vê em outros conglomerados que lidam com múltiplos aplicativos sob seu guarda-chuva; é o caso, por exemplo, do WeChat, extremamente popular na China e em outros países asiáticos, que possui uma estratégia de integração clara.
A transição, no entanto, tem alguns outros impactos além de uma questão de aproximação dos nomes. A visão que o Facebook tem do futuro, já delineada múltiplas vezes pela empresa, também depende da integração entre os serviços. Afinal de contas, Mark Zuckerberg já afirmou que pretende unir o Facebook Messenger, o WhatsApp e o Instagram Direct, permitindo que usuários se comuniquem entre si, independentemente da plataforma de sua preferência. A ideia da companhia é simples: se você usa o WhatsApp, que pertence ao Facebook, não há motivos pelos quais não seja possível enviar uma mensagem para um outro amigo que só usa o Instagram, que também pertence ao Facebook.
Além disso, para 2020, o Facebook também está botando suas fichas na Calibra, uma nova subsidiária que terá como missão alavancar o desenvolvimento da criptomoeda Libra. Parte importante desse projeto é integrar essa moeda virtual às plataformas da empresa para facilitar as transferências de valores monetários entre usuários, e faz todo sentido permitir que usuários do WhatsApp, Instagram e Facebook tenham mais comodidade para realizarem transferências entre si.
No fim das contas, isso tende a ter algum impacto positivo para a reputação do Facebook? Muito provavelmente, não, indica Arthur Igreja. A aproximação com Instagram e WhatsApp tende, pelo contrário, trazer efeitos negativos para esses aplicativos, permitindo que potenciais novos escândalos da empresa-mãe acabem respingando sobre serviços que até então estavam razoavelmente limpos.
Essa situação também pode gerar mais confusão com o público, também. Em uma situação hipotética em que haja novos vazamentos de dados de usuários, por exemplo, o Facebook terá que se explicar muito mais para apresentar um panorama claro da situação aos seus usuários. “Quando houver notícia sobre problema no Facebook, as pessoas já vão se perguntar ‘em qual parte? Será que afetou o WhatsApp?’. Então eles vão precisar se explicar inúmeras vezes: vazaram dados, mas não do Facebook-WhatsApp, só do Facebook-Facebook”, aponta o professor da FGV.
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