RIO – Se você nunca ouviu um “fiu-fiu” ou “linda” no pé do ouvido enquanto andava pela rua, provavelmente você é um homem. Mas, se chegou até aqui, é porque está interessado em entender a experiência da mulher. No clássico “O segundo sexo”, que não está na lista abaixo mas o indicamos com vontade em qualquer tempo, Simone de Beauvoir diz que “ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. E é essa construção cultural do papel feminino que só mesmo elas, que a vivem na pele, conhecem. Por isso preparamos uma lista de dez livros, entre ficção e não-ficção e assinados por mulheres, que mostram como o mundo é visto e sentido por elas. Se joguem na lista com amor, homens!
“A amiga genial”, de Elena Ferrante
“A amiga genial” é o primeiro título da Série Napolitana, composta por quatro livros, da autora Elena Ferrante.
No primeiro romance, conhecemos a infância e adolescência de Elena Greco, uma menina criada em uma vizinhança pobre de Nápoles na década de 1950.
Elena, conhecida como Lenu, era a menina mais inteligente da escola, até a chegada de Rafaella Cerullo, a Lila, que chama atenção pela sua rebeldia e excepcional inteligência.
Pelos olhos de Lenu, acompanhamos uma narrativa íntima sobre as vidas das meninas e os desafios enfrentados por elas que acreditam no estudo como a única alternativa para escapar do mesmo destino de todas as mulheres do bairro: casa, filhos e servidão ao marido.
Mais do que um romance sobre a intensidade e a complexa dinâmica da amizade entre as meninas, Elena Ferrante traz assuntos como a violência doméstica, a síndrome da impostora, relacionamentos abusivos e autoestima.
“O conto da Aia”, de Margareth Atwood
Escrito em 1985, o romance de Margareth Atwood continua atual. A ficção futurística da autora se passa em um Estado teocrático e totalitário, onde as mulheres são as principais vítimas de opressão e passam a ser consideradas propriedades do governo.
No romance, conhecemos a história das aias, cuja única função social é a procriação. Elas vivem em um estado máximo de submissão e são torturadas em casos de desobediência.
As aias são entregues aos generais do Estado, que as estupram em rituais religiosos até que engravidem. Após o nascimento do bebê, elas são obrigadas a se separar das crianças, que não são consideradas suas filhas.
A história é contada por Offred, uma aia que, assim como todas as outras, foi obrigada a se separar de familiares e a abandonar toda a sua vida de antes do golpe. No romance, ainda conhecemos Ofglen, uma aia seriamente punida por sua sexualidade.
“O conto da Aia” é um bom romance para quem deseja ver sob os olhos de uma mulher os horrores dos abusos e da submissão.
“Americanah”, de Chimamanda Ngozi
O livro escrito por Chimamanda Ngozi conta a história de Ifemelu, uma jovem nigeriana que tem a sua vida modificada pelo governo militar que se impõe sobre a capital da Nigéria, Lagos, sua cidade.
No ápice de um romance com Obinze, a menina se vê pressionada a mudar para os Estados Unidos, onde acredita ter uma alternativa às universidades nacionais, paralisadas por sucessivas greves, além da promessa de qualidade de vida.
Mesmo com destaque no mundo acadêmico, Ifemelu se depara, pela primeira vez, com questões raciais, além das dificuldades que precisa enfrentar por ser uma mulher, negra e nigeriana nos Estados Unidos.
“Quem tem medo do feminismo negro?”, de Djamila Ribeiro
O livro reúne um ensaio autobiográfico e uma seleção de artigos originalmente publicados por Djamila Ribeiro, uma filósofa, feminista e acadêmica brasileira, entre 2014 e 2017.
Em muitos textos, Djamila reage a situações do cotidiano, destrinchando conceitos e apontando situações machistas e racistas. Entre os temas abordados pela acadêmica, estão a intolerância às religiões de matriz africana, as políticas de cotas raciais e as origens do feminismo negro nos Estados Unidos e no Brasil.
O livro é uma boa opção para quem entender o machismo e o racismo presentes em nossa sociedade.
“Eu sou Malala”, de Malala Yousafzai
“Eu sou Malala” é o relato autobiográfico de Malala Yousafzai, a menina que aos 15 anos sofreu uma tentativa de assassinato pelo Talibã por defender o direito das mulheres a estudar.
Malala vivia no vale do Swat, uma região no norte do Paquistão dominada pelo Talibã. Em 9 de outubro de 2012, foi atingida por um tiro na cabeça dentro do ônibus escolar enquanto voltava para casa.
Após uma recuperação milagrosa, Malala começou a viajar pelo mundo contando a sua história e se tornou a mais reconhecida ativista da luta pelo direito à educação feminina, chegado a receber o Prêmio Nobel da Paz com apenas 16 anos.
“O feminismo é para todo mundo”, de Bell Hooks
Bell Hooks é uma das mais importantes feministas negras da atualidade. Em “O feminismo é para todo mundo”, último livro lançado pela intelectual, ela incentiva os leitores a descobrirem como o feminismo pode tocar e mudar a vida de mulheres, homens, crianças, jovens e adultos.
Na obra, Hooks apresenta a visão original sobre políticas feministas, direitos reprodutivos, entre outros assuntos, como beleza e violência. A autora também aponta vitórias do movimento feminista e a importância dessas conquistas na vida das mulheres e das pessoas ao seu redor, além das opressões impostas pelo machismo.
“Persépolis”, de Marjane Satrapi
“Persépolis” é a autobiografia em quadrinho de Marjane Satrapi, uma romancista nascida no Irã. Em 2007, a obra ganhou uma adaptação para o cinema, se transformando em uma animação, que chegou a concorrer ao Oscar.
O livro começa com a infância de Marjane no Irã, em um cenário político tenso, que levou ao início da república islâmica comandada pelos aiatolás. Com apenas dez anos, Marjane se viu obrigada a usar o véu islâmico e a estudar em uma sala de aula formada apenas por meninas, chamando imediatamente a atenção do leitor para as opressões sociais sofridas pelas mulheres.
Nascida em uma família considerada moderna para os padrões locais, Marjane tinha um pensamento considerado crítico em relação às injustiças que via ao seu redor. Por conta do momento político, a jovem acabou sendo mandada para a Europa, onde entrou em um enorme conflito de identidade, já que teve que mudar seus hábitos para se enturmar com os amigos, que a consideravam muito conservadora.
“A guerra não tem rosto de mulher”, de Svetlana Aleksiévitch
Quase um milhão de mulheres lutaram no exército vermelho durante a Segunda Guerra Mundial. São as memórias dessas veteranas, adolescentes, mães, irmãs e esposas que Svetlana Aleksiévitch traz de maneira angustiante e arrebatadora.
Atiradoras de elite, desarmadoras de minas terrestres e bombas, enfermeiras, médicas, pilotos etc., essas mulheres nunca tiveram suas trajetórias contadas na história. Antes, elas eram contadoras, professoras, secretárias, que subitamente se viram em um campo de batalha, tendo que usar coturnos enormes e cuecas, já que o exército não fornecia roupas para as combatentes nem os absorventes, que eram substituídos por camisetas roubadas.
“Memórias de uma moça bem comportada”, de Simone de Beauvoir
Esta é uma obra autobiográfica de Simone de Beauvoir, uma das filósofas e feministas mais influentes de todos os tempos. O livro é dividido em três partes: infância, adolescência e vida adulta. Logo no título, Simone já apresenta ao leitor uma de suas críticas à sociedade burguesa em que foi criada, que ditava que mulheres deveriam ser “bem comportadas”, coisa que ela nunca conseguiu ser.
A autora narra o período em que estudou em uma escola católica exclusiva para meninas, onde era ensinado que o destino de todas era o casamento ou o convento, pensamento que na época já era fortemente questionado por ela.
Ao longo do livro, Simone ainda relata o seu romance com uma amiga de infância além de muitos outros casos que teve com mulheres ao longo de sua vida. A autora também apresenta pensamentos e acontecimentos que a tornaram a grande pensadora que o mundo conheceu.
“O diário de Anne Frank”, de Anne Frank
O livro é a íntegra do diário da menina judia Anne Frank entre os anos de 1942 e 1944, quando com apenas 15 anos foi levada para um campo de concentração nazista.
Em seu diário, Anne narra de maneira íntima e tocante sua rotina, seus medos e pequenas alegrias enquanto estava escondida com seus familiares e alguns conhecidos em um sótão, numa tentativa de sobreviver aos horrores do Holocausto.
O depoimento de Anne é um precioso documento, em que é possível ver não só as atrocidades cometidas pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial, mas também a força que uma menina de apenas 12 anos pode ter.
* estagiária sob supervisão de Renata Izaal