Crivella, o imprudente – Jornal O Globo

101
Anúncio Patrocinado


A força e o volume das chuvas que inundaram o Rio no começo da semana seriam capazes de provocar uma tragédia em qualquer cidade do mundo. A diferença é que, em qualquer cidade do mundo, o prefeito trabalharia para amenizar as consequências da enchente. No Rio, o prefeito trabalha para torná-las ainda mais graves.

No fim da noite de segunda-feira, os cariocas enfrentavam ruas alagadas para chegar em casa, muitos simplesmente protegiam-se em áreas cobertas e esperavam o tempo passar, a maioria se preocupava com o que poderia ter acontecido com seus amigos e parentes. Já se sabia de três mortes. Foi quando o prefeito Marcelo Crivella deu uma entrevista tentando tranquilizar a população: ele garantiu que a Prefeitura tinha “vinte homens na rua” cuidando de tudo.

Vem cá, vinte homens? Talvez esse número fosse suficiente para resolver os problemas da pracinha do Bairro Peixoto, aqui perto de casa. Mas toda a cidade? No dia seguinte, ele explicou que só havia vinte homens de plantão na Secretaria de Conservação. A equipe de duzentas pessoas responsável por manter a rede de drenagem em funcionamento é terceirizada. “A prefeitura não tem esses homens próprios. Nós temos seis empresas que fazem esses contratos, tanto de conservação quanto de drenagem. Eles são mobilizados quando a gente precisa”.

Ué, e na segunda-feira não estávamos precisando? O prefeito diz que mobilizou a equipe extra, mas aí o trânsito estava muito complicado e ela chegou atrasada. Vem cá, o prefeito se surpreendeu com o trânsito complicado na noite da maior chuva dos últimos 22 anos? E, se a equipe não aparece na hora em que é necessária, de que adianta manter esse serviço terceirizado?

Anúncio PatrocinadoGestor de Tráfego - Do Mil ao Milhão: Torne-se um Especialista em Tráfego Pago

Na terça-feira, o prefeito admitiu que errou. Quer dizer, errou, não. Ele usou um eufemismo para justificar a série de desacertos ocorridos durante a chuva. “Nós fomos imprudentes”, resumiu, numa surpreendente autocrítica. O prefeito vai me desculpar, mas imprudente fui eu que, naquele dia mesmo, saí de casa em direção ao trabalho arriscando-me a me afogar nas ruas do Jardim Botânico. O prefeito foi só incompetente.

O problema do prefeito é que ele já percebeu que, em situações como a que o Rio vem sofrendo, é de bom tom aparecer no local das tragédias. Na rua, é cercado pela imprensa que teima em fazer perguntas que o incomodam. Aí, como uma boneca Emília quando provocada, abre sua torneirinha de asneiras. “Se a gente ficar olhando pra trás, não vai resolver bulhufas”, disse, na quinta-feira. Não é bem assim. Na verdade, se o prefeito tivesse olhado pra trás, e para os efeitos das outras duas grandes tempestades ocorridas este ano, talvez não tivesse repetido esta semana os erros anteriores.

E a torneirinha continuou aberta quando, ao explicar por que demorou três dias para decretar estado de calamidade pública na cidade, disse que a “pior coisa na vida é a gente ter pressa”. A esta altura, o número de mortos já tinha subido para dez. O prefeito pode não ter pressa, o que não diminui em nada a pressa que o povo tem para o Rio voltar a ser tratado com respeito. Calamidade pública mesmo é o Crivella.



Fonte do Artigo

Anúncio