Como a Rappi e outras startups mudam o Carrefour

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O Carrefour é líder no varejo alimentar no Brasil e com mais de quatro décadas de atuação no país. No entanto, precisou repensar a operação com o crescimento de startups muito menores e mais jovens. Reformou as lojas para criar novos estoques, mudou a disposição de itens em loja e até desenvolveu a própria moto para entregas. 

A Rappi, startup colombiana de entregas, Cybercook, site de receitas e a Propz, de análise de dados, são parceiras desse processo do Carrefour, que teve vendas brutas de 14,2 bilhões de reais no primeiro trimestre de 2019. À frente do projeto está Paula Cardoso executiva que nos últimos seis anos atuava como CEO do Carrefour Soluções Financeiras (CSF) e que no ano passado também esteve à frente da transformação digital do Carrefour Brasil. Desde janeiro, ela lidera a nova divisão Carrefour E-Business e falou à EXAME sobre os planos da varejista para o comércio eletrônico. 

O projeto de crescer por meio de startups veio de uma viagem à China, um dos países mais desenvolvidos no e-commerce alimentar. Percebeu que as empresas se desenvolviam por meio de quatro pilares: dados, conteúdo, logística e pagamentos. 

Ao invés de criar negócios próprios nessas áreas, o que poderia tomar mais tempo e dinheiro, optou por aquisições e parcerias com startups. “As parcerias aceleram o e-commerce a baixo custo, além de aprendermos muito no caminho”, diz Cardoso.

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Um dos principais parceiros do Carrefour é a Rappi, startup colombiana que já levantou 1,7 bilhão de dólares em aportes. A parceria foi firmada no início deste ano e a expectativa é que o aplicativo seja responsável por 30% das suas vendas online até o fim do ano. 

Desde então, já fez mudanças da logística ao mix de lojas. A parceria dá uma nova vida a um formato que estava apagado, o hipermercado. Cerca de 15 lojas serão reformadas ainda esse ano para ganhar um estoque separado, específico para o comércio eletrônico, para facilitar as compras dos entregadores do aplicativo. Em quatro anos, serão 80 lojas reformadas com estoques separados. O espaço não abrange os itens frescos, que continuam sendo retirados nas lojas.

Há ainda produtos específicos, que demandaram a criação de seus próprios centros de distribuição. A empresa percebeu, por meio do aplicativo, que havia uma demanda por cerveja gelada em todas as horas do dia. Criou então estoques em 10 lojas de formato de proximidade para entregar bebidas geladas, como cerveja, água e refrigerante, 24 horas por dia. 

Com o app da Rappi, a varejista conquista novos clientes. Cerca de 50% das vendas feitas pelo Rappi são para novos consumidores. 

Além do Rappi, outros formatos de entrega também estão crescendo. O Drive, retirada de carro dos itens comprados online já disponível em 13 locais, já é responsável por 6% das vendas digitais. Enquanto as compras pelo Rappi são menores e de mais conveniência, as compras pelo site ou app do Carrefour são maiores, com itens mais caros e mais pesados. “Precisamos estar prontos para atender os dois públicos, de compras de cinco a 30 itens”, diz.

Para entregar as compras feitas pelo app ou site Carrefour, a companhia também usa uma frota própria, especialmente desenvolvida para essa finalidade. O baú da moto de entrega é criação da varejista. 

Outra startup que está transformando as vendas é a Cybercook, site de receitas adquirido pela companhia em novembro do ano passado.

“Há muitas famílias que não querem pensar no que vão jantar e a Cybercook facilita esse planejamento, com mais de 100 mil receitas cadastradas”, afirma Cardoso. As receitas podem ser filtradas por preço, tempo de preparo e se são vegetarianas, livres de glúten ou lactose. Para aperfeiçoar as receitas, o time da Cybercook tem uma cozinha experimental.

Para a varejista, é um provedor de informações sobre o que os consumidores mais estão buscando no momento, ao lado da Propz, startup adquirida em 2018. Cerca de 70% das vendas do Carrefour já são identificadas através do CPF, outra ferramenta para conhecer o cliente melhor. 

Como a procura por itens vegetarianos e veganos aumentou 400% no último ano, o número de prateleiras dedicadas a esses produtos também cresceu. No verão deste ano, por exemplo, a tendência era o chup-chup, geladinho ou sacolé, um picolé feito em casa. A varejista, então, deu mais destaque para os ingredientes para o doce.

A transformação digital também vem de dentro para fora. Segundo a executiva, o processo mudou a governança da companhia e até a forma como ela conduz reuniões. Ao invés de olhar os formatos de mercado, como hipermercados, lojas de proximidade ou e-commerce, a empresa é incentivada a olhar a jornada do cliente de forma mais ampla. As reuniões incluíram diretores de logística e de tecnologia, por exemplo. 

“É preciso mudar a mentalidade da empresa. Fazer projetos de TI que demorem dois anos já não é possível, por exemplo”, afirma. “Uma das coisas que você aprende nesse trabalho é que há muitas perguntas e poucas certezas, mas a empresa precisa aprender a testar e errar ou acertar.”

Mercado pequeno, mas duro

O comércio eletrônico de alimentos – que abrange compras em supermercados, mas não pedidos de restaurantes por delivery – ainda é muito pequeno no Brasil. Se o e-commerce representa 4% das vendas totais, a venda de alimentos pela internet é de apenas 0,4% do total. Mesmo assim, grandes companhias estão correndo atrás do consumidor através de sites e aplicativos próprios e ajuda de startups. 

Para a diretora, o tamanho diminuto é resultado tanto da falta de cultura de comprar alimentos pela internet quanto pela falta de preparo das varejistas de atender essa modalidade. “Comprar cerveja na internet é igual à loja física. Não precisa escolher a mais cheirosa ou madura, como se faria com uma fruta. Não é mais comum por uma questão cultural”, afirma.

O comércio eletrônico é a divisão que mais cresce dentro da companhia, que além das lojas Carrefour ainda é dona do atacarejo Atacadão. Pela Rappi, site ou aplicativo, cresceu 84% em vendas no primeiro trimestre do ano. Claro, também é hoje a menor divisão. Representa 11% do faturamento total da companhia, contra 6% há um ano.

O mercado de comércio eletrônico alimentar não é fácil. A estratégia do Carrefour é seguida de perto pelo seu principal concorrente, o Grupo Pão de Açúcar. A empresa anunciou a expansão do serviço James Delivery, aplicativo de entrega de tudo, para São Paulo. 

A startup, que até então atuava apenas em Curitiba, foi adquirida pelo grupo em dezembro para fazer entregas em até uma hora de itens urgentes para as lojas do Pão de Açúcar e Extra, bem como de produtos de restaurantes e drogarias. O app de entregas é uma das apostas da empresa no comércio eletrônico alimentar, divisão que cresceu 63,5% no quarto trimestre do ano passado.

Já outros concorrentes deixaram o jogo. O Walmart encerrou as operações virtuais e decidiu focar apenas em lojas físicas em maio deste ano. Já em fevereiro, a Glovo, concorrente do Rappi, saiu do Brasil, pressionada pela matriz espanhola por não dar o resultado esperado em seu primeiro ano no país.

“A dificuldade das empresas grandes é se reinventar ou vão morrer”, diz Cardoso. 



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