Na madrugada do último dia 8 de março, um casal da zona rural de São Mateus do Sul, no Paraná, acordou com um estranho estrondo vindo da área externa de sua propriedade. Pela manhã, aquele fato começou a fazer sentido com os relatos e as imagens da reentrada do segundo estágio do foguete Falcon 9 da SpaceX, que ocorreu naquela madrugada.
Passada uma semana, enquanto vistoriavam as cercas de sua propriedade, eles encontraram um estranho objeto de metal retorcido que parece ter caído, marcando o solo e a vegetação no local. Logo concluíram que deveria se tratar de um pedaço daquele foguete da SpaceX que teria caído em suas terras. E aí um questionamento se tornou inevitável: O que fazer se eu encontrar um pedaço de uma espaçonave dessas no meu quintal??
Existem tratados internacionais que regulamentam e definem as responsabilidades e os procedimentos a serem seguidos em ocasiões como essa. A população em geral não têm obrigação de conhecer o conteúdo desses tratados. Por isso, o melhor a fazer é procurar as autoridades.
Mas é importante saber que, para todo o caso, a responsabilidade pelo lixo espacial e pelos danos causados por ele é do país de origem do objeto. Ou seja, mesmo o foguete sendo da SpaceX, isso deve ser sempre tratado entre as nações envolvidas, ou seja, seria uma conversa, através das vias diplomáticas, entre o governo brasileiro e o americano.
Isso é definido pelo Tratado do Espaço Exterior, estabelecido pela ONU em 1967. É um acordo internacional sobre os princípios que regem as atividades dos países na exploração e uso do espaço exterior, incluindo a Lua e outros corpos celestes. De fato, é um tratado bem amplo, e o lixo espacial é apenas um dos pontos abordados.
Antes de tudo, o tratado tenta evitar que ocorram situações perigosas como a queda de algo grande em um local habitado. Mas ele também se preocupa em estabelecer uma forma de monitorar e fazer cumprir tais orientações. Por fim, o tratado estabelece uma estrutura de obrigações e responsabilidades para o caso das coisas derem errado.
Para efeitos práticos, o acordo prevê que os foguetes devem ter, sempre que possível, uma forma de realizar uma reentrada controlada, evitando áreas habitadas do planeta. E a SpaceX tem esse sistema em seus segundos estágios, mas no caso do foguete que caiu na semana passada, como ele levava o Turksat 5B para uma órbita geoestacionária, isso não era possível.
Outro ponto, prevê que os foguetes devem evitar explosões no espaço, pois geraria detritos que poderiam prejudicar outras missões espaciais. Por isso, em missões como a do Turksat 5B, como o segundo estágio acaba ficando muito tempo à deriva, ele precisa esvaziar seus tanques de combustível para afastar qualquer risco de explosão. Por isso, ele perde a capacidade de realizar uma reentrada controlada.
Agora, imagine se, ao invés de cair no campo, o pedaço do foguete tivesse atingido sua casa. O que o Tratado do Espaço Exterior lhe permitiria fazer?
A regra é clara! Ainda assim, você precisaria procurar as autoridades e essa questão teria que ser resolvida de governo para governo. O Tratado do Espaço Externo declara que as nações são internacionalmente responsáveis por qualquer dano causado por uma nave espacial, mesmo que o dano tenha sido causado por uma empresa privada daquele país. Os governos podem até acordar que a empresa responsável iria te indenizar diretamente, mas isso teria que ser definido entre eles.
Só que as chances que isso ocorra são realmente muito pequenas. Para se ter ideia, a única vez em que essa parte do tratado foi utilizada foi em 1978, quando o satélite soviético Cosmos 954 caiu no Noroeste do Canadá. O local era inabitado, só que o Cosmos utilizava um pequeno reator nuclear como fonte de energia. E quando caiu, espalhou detritos radioativos em uma ampla faixa de terra.
Na época, o Canadá pediu 6 milhões de dólares canadenses para a União Soviética, para cobrir parte dos custos de limpeza, que foi realizada por uma equipe canadense e americana. Entretanto, no acordo final, os soviéticos pagaram apenas 3 milhões.
Agora, as chances de uma pessoa ser morta atingida por lixo espacial são próximas de zero. Mas caso isso aconteça, o tratado espacial fornece uma estrutura muito boa para lidar com essa fatalidade. Claro que essa parte do acordo não é algo que a gente quer ver funcionar. Preferimos que empresas e governos cuidem cada vez mais para que esse tipo de evento ocorra cada vez menos.
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