‘A saída é a cooperação’, diz Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC

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É dramático o impacto da pandemia do coronavírus na vida das pessoas e nos sistemas nacionais de saúde. As consequências para a atividade econômica e o comércio não são menos assustadoras. A economia mundial sofreu choques de oferta e demanda repentinos, sincronizados, generalizados e profundos. Não há precedentes dessa natureza ou magnitude desde a Grande Depressão dos anos 1930. As projeções do FMI para 2020 indicam retração do PIB global em cerca de 3%. No comércio, a Organização Mundial de Comércio (OMC) trabalha com dois cenários. No otimista, estimamos uma queda de pelo menos 13% no volume global de comércio. No pessimista, a retração poderá chegar a 32% ou mais. Ou seja, mesmo no melhor cenário, o impacto comercial será maior que o da crise financeira internacional de 2008.

Mas, enquanto nas crises anteriores a retomada trilhou um longo percurso, desta vez poderíamos testemunhar uma recuperação relativamente célere e sólida. Isso porque a crise atual não decorre de desalinhamentos ou vulnerabilidades nos fundamentos da economia global. Uma vez retiradas as medidas que congelam a economia, a retomada das atividades poderá nos recolocar em patamares pré-pandemia em prazo razoavelmente curto.

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Dois fatores determinarão a velocidade e o dinamismo dessa recuperação. O primeiro é o tempo de duração da pandemia. O segundo são as políticas de estímulo econômico e comercial adotadas pelos governos — em casa e coletivamente.

A prioridade mais imediata é, sem dúvida, o combate à pandemia, buscando, onde possível, mitigar o dano econômico causado às pessoas, empresas e países. Mas olhar adiante também é crucial. As decisões tomadas agora determinarão os contornos da futura recuperação e as perspectivas de crescimento nacional e global. É preciso estabelecer as bases para uma recuperação forte, sustentável e socialmente inclusiva.

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“Ainda que surja a tentação de buscar a autossuficiência, ficará evidente que esse não é o caminho”

Para chegar lá, as políticas fiscal, monetária e comercial precisam apontar na mesma direção. Uma maior coordenação internacional também aumentaria nosso poder coletivo de combate à recessão. Após a crise de 2008, por exemplo, a imediata coordenação entre os governos para manter a economia global dinâmica e aberta funcionou como um eficaz multiplicador de forças. Aplacou-se o pânico, apontou-se o norte e conteve-se o ímpeto protecionista.

Manter os mercados abertos, conectados e previsíveis é fundamental para estimular os investimentos necessários à retomada econômica e permitir que o crescimento em um país alavanque o de outro. Famílias e empresas ficam mais protegidas do risco de escassez de oferta e aumento de preços.

A pandemia do coronavírus deixará, sem dúvida, sequelas psicológicas na sociedade. No comércio não será diferente. Empresas procurarão equipar-se para enfrentar choques semelhantes de oferta e demanda — seja em resposta a pandemias, seja para debelar crises de natureza econômica. Diversificarão suas cadeias de produção e suprimento — tanto no mercado interno quanto no externo. Haverá expressivo fortalecimento das plataformas digitais e do comércio eletrônico, favorecendo novos tipos de comportamento, como teletrabalho, compras on-line, impressões 3D, cuidados no contato físico entre as pessoas. Diversos países deverão adotar protocolos de saúde mais robustos e favorecer o aumento no estoque de suprimentos considerados críticos.

O comércio internacional continuará sendo um mecanismo fundamental para o abastecimento de bens essenciais a preços acessíveis. Alguns fatos são incontornáveis. Não tem volta atrás. Para produzir máscaras sanitárias na Europa, continuará a ser necessário importar o algodão. Para construir equipamentos de ponta para a saúde, a indústria precisará do conhecimento e da capacidade, das peças e componentes que outros países detêm, fazem melhor e a preços mais competitivos. Essa natureza fundamental do comércio não mudará.

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Ainda que surja a tentação de buscar a autossuficiência em algumas áreas consideradas “essenciais”, aos poucos ficará evidente que esse não é o caminho. A autossuficiência é inviável na maior parte das vezes e tem um custo altíssimo para a sociedade, sobretudo no médio e longo prazo.

A cooperação e a solidariedade melhorarão nossas perspectivas econômicas. E no centro desse tabuleiro se encontram as organizações internacionais — como a OMC — e os foros políticos de coordenação, caso do G20.

Espaços únicos de cooperação, as organizações internacionais são riquíssimas em informação e conhecimento especializado. Têm a visão do todo, que é fundamental no enfrentamento de desafios globais. Isso está evidente no papel que desempenham hoje a OMC, a OMS e outras organizações internacionais na coordenação das respostas à crise e na recomendação de políticas públicas. Essas instituições, porém, não são organismos supranacionais. Não podem tomar decisões pelos seus membros. Sua efetividade está diretamente ligada ao compromisso dos países em fazer uso desses espaços, participar de maneira vocal e construtiva dos trabalhos e, em última instância, implementar as recomendações que são feitas.

Líderes do G20, do setor privado, da sociedade civil têm destacado a importância dessa coordenação internacional. A comunidade internacional ainda precisa avançar muito nesse quesito, sobretudo no combate a pandemias. Se quisermos respostas rápidas e eficazes, precisaremos de coordenação e entendimentos internacionais que sejam objetivos e pragmáticos. Apesar de algumas tratativas no G20 e em alguns foros especializados, ainda não estamos vendo o tipo de coordenação que seria necessário.

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Desafios globais exigem soluções globais, coordenadas, na saúde pública e na economia. As gerações futuras precisarão estar mais bem equipadas, com instrumentos de concertação ágeis, automáticos e eficazes. Essa lição precisa ser finalmente aprendida.

* Roberto Azevêdo, diplomata brasileiro, é diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC)

Publicado em VEJA de 13 de maio de 2020, edição nº 2686



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