“A gente veio conversando sobre isso no avião”, diz Letícia Modanez, 17. “Não era o desejo de ninguém vir embora, a maioria queria ter ficado lá”, ela conta. Letícia é parte de um grupo de 18 adolescentes brasileiros repatriados pelo Itamaraty na quarta-feira (15). Eles estavam em diferentes cidades da Índia, em um intercâmbio escolar organizado pelo Rotary Club. A maioria vivia no país desde agosto passado. O voo saiu de Nova Delhi e trouxe, ao todo, 207 brasileiros. Os custos e as permissões para a viagem ficaram por conta do governo brasileiro.
No saguão, as famílias aguardavam os jovens com cartazes, flores e alta expectativa. O motivo, claro, é a situação excepcional provocada pela pandemia de Covid-19. “A ansiedade é grande”, dizia a professora Silvia Cardia, mãe de Lauren, 17.
O clima tenso entre os pais, no entanto, contrastava com a atitude dos adolescentes. A maioria precisou ser convencida pelas famílias, nas últimas semanas, sobre a necessidade de voltar para a casa na quarentena. “Ela também não queria vir, mas conseguimos fazê-la entender a situação”, diz Gilson Tristão, pai de Letícia, do início do texto.
O discurso entre os adolescentes é de que eles prefeririam terminar o intercâmbio, em agosto — embora o novo coronavírus tenha tornado esse plano impossível. “A sensação é de não ter concluído uma missão. Agora, já sabemos que não faremos os dois meses finais do curso, mas ainda não sabemos como ficará o ano letivo”, diz Lauren.
Além disso, os jovens se encontravam em situação confortável na Índia. “A gente tinha medo de voltar para cá. Ninguém queria interromper o intercâmbio e pegar um voo do nada [entre terem os documentos solicitados pela embaixada e o embarque, se passou uma semana]”, diz Beatriz Teixeira, 17 — que também precisou ser convencida pelos pais a voltar. “Não era só questão da Covid: a gente não queria voltar para a realidade”, ela afirma.
Conforme o desembarque avançava, os recém-chegados formavam grupos para se despedir uns dos outros no Terminal 3 de Guarulhos. Protagonizavam uma cena raríssima nos tempos da quarentena: se abraçavam em grupos, davam beijos e abraços de adeus, tiravam fotos em poses coletivas.
Na avaliação dos pais, os jovens estavam mal informados sobre a situação da pandemia. “A Índia é muito reclusa, a gente que passava informações sobre o coronavírus para ela”, diz Joyce Teixeira, mãe de Beatriz. “Eles não entenderam a gravidade da situação”, concorda Danilo, o pai da jovem.
“Eu estava sem televisão, em uma cidade no norte da índia. O hotel provisório que fiquei antes do voo, em Nova Delhi, também não tinha TV. Eu acompanhava a situação pelos meus pais, mesmo”, conta Beatriz.
“Na Índia, o primeiro ministro não vai à TV e diz quantos casos existem. Você tinha que procurar no Google para saber quantos mortos tinham na sua cidade”, diz Letícia, do início do texto. “Fiquei triste de voltar antes da hora. Várias viagens que a gente ainda iria fazer pela Índia precisaram ser canceladas. Ninguém gostou dessa situação”, conclui.
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