Um mecenas. É assim que Miguel Setas, presidente da empresa do setor elétrico EDP, se classifica ao comentar o novo investimento da multinacional portuguesa. No aniversário de São Paulo, ele anunciou que vai injetar 12 milhões de reais na restauração do Museu do Ipiranga, empacada desde 2013, quando o espaço foi interditado por apresentar rachaduras e marcas de umidade. “Sou apreciador de arte e frequentava o museu”, conta o executivo de 48 anos nascido em Lisboa e desde 2014 na cadeira de CEO.
Há onze anos morando na cidade, Setas costuma visitar o Masp e exalta a produção nacional na área. “Sinto que a cultura brasileira também é a minha cultura, porque me transformou.” A paixão se traduziu na condução dos rumos da EDP. “Investir nos museus foi uma forma de agradecer ao Brasil pela acolhida”, diz ele.
A história do Museu Paulista, nome oficial do Ipiranga, começa em 1895, quando foi aberto o prédio no alto de uma colina, onde 73 anos antes teria acontecido o famoso grito de Pedro I no fim da tarde de um 7 de setembro. Trata-se do mais antigo museu da cidade, que chegou a abrigar 450 000 itens — hoje, continuam ali apenas 30 000 objetos, como o quadro Independência ou Morte, de Pedro Américo, chumbado na parede. Os demais foram transferidos para outros acervos.
A USP, responsável pela administração, mas com orçamento comprometido pela folha de pagamento há anos, procura patrocinadores como a empresa portuguesa para financiar as obras necessárias. Inicialmente orçado em 21 milhões de reais, o custo do trabalho poderá atingir 120 milhões de reais.
Em dezembro, o escritório Hereñú + Ferroni Arquitetos foi anunciado como vencedor do concurso para o projeto de restauro. Ficou prevista a ampliação do edifício de 6 300 metros quadrados em mais 4 000 metros quadrados, que vão abrigar novas áreas de exposição, um auditório e até um mirante. Em parceria com a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base, a USP fará no próximo dia 20 um evento para uma nova rodada de arrecadações.
Além da EDP, a maior investidora até o momento, Santander, Petrobras e IRB Brasil apoiam a universidade. Em caixa, até agora, há 15 milhões de reais, dinheiro ainda insuficiente para completar o restauro até 2022, data do bicentenário da Independência, escolhida para a reinauguração. “Investimento é essencial para evitar tragédias como a do Museu Nacional e também para manter a sobrevivência de instituições”, diz a diretora do museu, Solange Ferraz de Lima.
Sob a gestão de Setas, a EDP participa ainda de outra iniciativa cultural de peso. A companhia é patrocinadora master da reconstrução do Museu da Língua Portuguesa, projeto para o qual desembolsou 20 milhões de reais, equivalentes a 26% da obra do complexo consumido por um incêndio em 2015. “Temos um compromisso como apoiadores do Brasil, queremos valorizar o patrimônio histórico-cultural daqui e de Portugal”, completou Setas.
No seu país natal, o aporte mais recente foi para o Maat — Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, inaugurado em 2016. Aqui, todos os investimentos foram feitos via Lei Rouanet, em vigor desde 1991. A maior parte dos recursos arrecadados provém de uma forma de financiamento chamada mecenato. Por meio dele, pessoas ou empresas atuam como patrocinadores e podem deduzir do imposto de renda os valores doados. “A nossa origem portuguesa faz com que essa parte da história seja algo muito importante. Torço para que as empresas nacionais possam contribuir no mesmo sentido”, completou o mecenas.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 06 de fevereiro de 2019, edição nº 2620.