NOVA DÉLHI – A Índia derrubou um de seus satélites no espaço com um míssil nesta quarta-feira, anunciou o primeiro-ministro Narendra Modi, que celebrou o primeiro teste desse tipo de tecnologia como um passo importante para o “poder espacial” do país. Se a informação for confirmada, a Índia será o quarto país a ter uma arma anti-satélite, depois de Estados Unidos, Rússia e China.
O teste aumenta o temor internacional relacionado a armas e material bélico espacial e de uma corrida armamentista entre rivais. Em referência ao incidente, o ministério das Relações Exteriores do Paquistão disse que o espaço é “uma herança comum da Humanidade” e que “todos os países têm responsabilidade para evitar a sua militarização”.
O Ministério das Relações Exteriores da China disse esperar que todos os países “possam proteger seriamente a paz e a tranquilidade no espaço”. Já os Estados Unidos e a Rússia não fizeram um comentário imediato.
A nova arma permite ataques a satélites inimigos, interrompendo os seus sinais de captação e distribuição de dados, e também pode ser usada na interceptação de mísseis balísticos.
— Nossos cientistas derrubaram um satélite em funcionamento a 300 quilômetros de distância no espaço, em órbita baixa — disse Modi em seu discurso, transmitido nacionalmente na TV. — A Índia fez uma conquista sem precedentes hoje e registrou o seu nome como uma potência espacial.
Modi enfrenta uma eleição geral no próximo mês, e o teste militar está sendo interpretado como um artifício de sua campanha. Mais cedo, ele postou no Twitter que faria um anúncio importante em uma transmissão nacional.
O primeiro-ministro é criticado por não conseguir atingir um alto crescimento econômico e criar empregos, e tem buscado compensar os pontos fracos com uma posição rigorosa em relação à segurança, que deve ajudá-lo nas urnas. No mês passado, a Índia realizou ataques a supostos campos de treinamento de militantes islâmicos dentro do território do Paquistão, o que levou a ataques de retaliação do país vizinho, em uma dramática tensão entre os rivais, que possuem armas nucleares.
O líder no Congresso do principal partido de oposição, Rahul Gandhi, parabenizou os cientistas de defesa pelo programa, mas criticou Modi por fazer do anúncio um grande espetáculo.
— Eu também gostaria de desejar ao primeiro-ministro um muito feliz Dia Mundial do Teatro — ironizou Gandhi.
O líder de outro grupo de oposição disse que iria apresentar uma queixa à Comissão Eleitoral contra Modi, por tentar obter capital político por meio do programa espacial. As eleições gerais da Índia começam em 11 de abril.
Sonho antigo
Há anos a Índia desenvolve um programa espacial, construindo satélites de geração de imagens da Terra e estações de lançamento de foguetes com tecnologias mais baratas do que a dos programas ocidentais.
O país enviou com sucesso uma sonda de baixo custo para Marte em 2014 e planeja sua primeira missão espacial tripulada até 2022. Este teste mais recente, realizado sobre uma ilha ao largo da costa Leste da Índia, tem como objetivo proteger ativos nacionais no espaço contra ataques estrangeiros, disse o governo.
“A habilidade obtida com o teste de míssil antissatélite garante uma dissuasão contra ameaças aos nossos crescentes ativos espaciais”, disse o Ministério das Relações Exteriores em comunicado.
O teste durou três minutos e foi feito na baixa atmosfera para garantir que não ficassem detritos no espaço e que o que restasse da explosão “voltaria a cair na Terra em poucas semanas”, disse o ministério.
Brahma Chellaney, especialista em segurança do Centro de Pesquisa de Políticas de Nova Dhéli, disse que os Estados Unidos, a Rússia e a China estão em busca de armas anti-satélite.
— O espaço está sendo transformado em uma frente de batalha, fazendo com que equipamentos espaciais de defesa se tornem importantes. Devido a isso, o sucesso do teste da Índia é significativo.
A China destruiu um satélite em 2007, criando a maior nuvem de detritos orbitais da história, com mais de 3 mil objetos, segundo a Fundação Secure World.
Ajay Lele, pesquisador sênior do Instituto de Estudos e Análises de Defesa, de Nova Délhi, financiado pelo governo, disse que a Índia foi estimulada a desenvolver sua capacidade antissatélite por causa do teste chinês.
Há anos cientistas indianos buscaram aprovação política para conduzir os testes, mas vários governos se calaram, temendo a condenação internacional, disse uma autoridade de defesa indiana.
Uma porta-voz da missão dos EUA em Genebra, que lida com questões de desarmamento, não fez comentários imediatos. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, se recusou a comentar, redirecionando as perguntas para o Ministério da Defesa.
70 anos de armas espaciais
Os Estados Unidos realizaram o primeiro teste anti-satélite em 1959, quando os próprios satélites eram raros e novos.
Nos anos anos 1960 e 1970, a União Soviética realizou testes semelhantes, testando uma arma que se aproximaria de satélites inimigos e os destruiria com explosivos.
Em 1985, os Estados Unidos testaram o ASM-135, lançado de um caça F-15, destruindo um satélite americano chamado Solwind P78-1.
Não houve testes por mais de 20 anos, até 2007, quando a China também fez seu teste. No ano seguinte, os Estados Unidos realizaram a Operação Burnt Frost, usando um míssil SM-3 lançado por navios para destruir um satélite espião em desuso.
Uma preocupação para a Índia é que a China pode vir ajudar o Paquistão, seu velho aliado, a neutralizar qualquer vantagem que a Índia ganhe.
— Eu não acho que o Paquistão já tenha alcançado esse nível tecnológico por si só, mas o país não está mais sozinho — disse Uday Bhaskar, diretor da Society for Policy Studies, outro instituto de pesquisas de Délhi. — O Paquistão e a China têm um tipo estratégico muito profundo de parceria. Portanto, algum tipo de compartilhamento de tecnologias não pode ser desconsiderado.