A instalação de pedras em frente a uma agência bancária do Itaú na Avenida Cidade Jardim indignou a arquiteta Clara Reynaldo. A profissional, que não ia até o local desde março do ano passado, usou as redes sociais para criticar a obra. Ela acredita que a instalação tenha o objetivo de afastar pessoas em situação de rua. “Não consigo imaginar outra função. Não tem valor estético, não tem valor funcional, não é uma instalação artística. Nada além de uma arquitetura agressiva contra moradores de rua”, falou à Vejinha.
Pela cidade, não é incomum encontrar outros exemplos de intervenções que têm o objetivo de afugentar quem vive nas ruas. “Tinha visto antes no episódio do padre Júlio Lancellotti. [Em outras oportunidades] reparei em bancos feitos para as pessoas não deitarem e pregos em volta da mureta para ninguém se sentar”, conta a arquiteta.
Tais instalações são exemplos da chamada “arquitetura hostil”, termo cunhado em 2014 pelo jornalista britânico Ben Quinn em reportagem do jornal The Guardian. A expressão se refere a obras que impedem ocupação de espaços públicos como bancos, muros e até calçadas.
Um exemplo recente é o caso dos pedregulhos instalados no viaduto Dom Luciano Mendes de Almeida, na avenida Salim Farah Maluf, no Tatuapé, Zona Leste da cidade. O caso ganhou visibilidade após denúncias do padre Júlio Lancellotti, que chegou a quebrar a marretadas as pedras em ação simbólica.
À Vejinha, ele criticou a obra da prefeitura. “Uma cidade que tem tanta demanda, áreas de risco, córregos abertos, falta de moradia, uma série de coisas, gastar tempo e dinheiro nisso? Fazer uma obra higienista, desumana e hostil? É cruel”, disse o pároco na ocasião.
A administração municipal afirmou que não tinha conhecimento da obra do viaduto. Disse que abriu sindicância e que o servidor responsável pela ação foi exonerado do cargo. Logo após as críticas, o concreto começou a ser retirado do local.
A Vejinha entrou em contato com o banco Itaú para entender os motivos que levaram à instalação das pedras na agência 0169, mas não obteve retorno até momento da publicação desta matéria.
Protesto artístico
O tema tem ganhado visibilidade nos últimos dias em São Paulo. Na última segunda-feira (15), o artista plástico russo Fyodor Pavlov-Andreevich, de 42 anos, realizou um protesto em forma de performance na esquina das ruas Augusta e Oscar Freire, nos Jardins. Totalmente nu, ele passou algumas horas sentado sobre pedras para denunciar a arquitetura hostil na cidade.
O padre Júlio esteve presente na ação do artista. “Ele é russo e esteve visitando a minha paróquia e participou de ações comigo e com os moradores de rua. Me contou que queria fazer essa ação contra a arquitetura hostil da Prefeitura com essas pessoas e que eu fosse lá apoiar”, contou o padre ao portal G1. “Acho sempre importante qualquer tipo de ato que chame a atenção para o que ocorre na cidade, para transformar a cidade mais humana”, acrescentou.
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