Boa intenção, difícil aplicação | VEJA

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Pode dar errado a ideia de criar um fundo para compensar altas do preço do petróleo, quando provocadas por crises. A intenção, evidentemente, é boa: tentar evitar o impacto no bolso dos consumidores. Mas a medida pode acarretar muitos outros problemas. Sua implementação exigiria o uso de dinheiro público, que poderia ser mais bem aplicado em educação, saúde e segurança, tanto mais se levada em conta a atual escassez aguda de recursos. Ademais, a ideia contradiz a posição oficial em prol da extinção de fundos. O governo precisa, pois, ter cuidado no exame da matéria.

Como é habitual em assuntos que envolvem o setor público, o diabo mora nos detalhes. Como fazer? Propostas estapafúrdias aparecem nesses momentos, como a de reduzir o ICMS sobre o preço dos combustíveis. Além da impropriedade de usar tributos sobre o consumo com tal finalidade, a medida agravaria a já crítica situação dos estados e municípios, os donos do ICMS.

Fala-se em empregar royalties do petróleo da União. Acontece que há um teto de gastos federais (Emenda Constitucional Nº 95, de 2016). Caso isso fosse adotado, haveria uma despesa, obrigando à redução de outros gastos, muito provavelmente dos já exíguos investimentos. Cairia o potencial de crescimento da economia.

“Por tudo isso, o governo faria bem se desistisse da ideia, a qual não tem paralelo em outros países”

Mais grave ainda seria neutralizar o papel fundamental do sistema de preços em uma economia de mercado como a brasileira. Ao emitirem sinais aos agentes econômicos, os preços contribuem para organizar a atividade na área, coordenando decisões de consumidores e produtores. O consumo de um bem costuma diminuir quando seu preço aumenta. Com a atuação do fundo, o preço emitiria sinais errados aos consumidores, induzindo-os a manter o ritmo de consumo de um bem que ficou mais caro para o país.

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O fundo poderia servir apenas para casos de volatilidade excessiva do preço dos combustíveis, que é ruim para a economia. Mesmo assim, as oscilações tenderiam a ser passageiras, dada a situação atual de oferta maior do que a demanda no mercado internacional de petróleo.

Ainda que houvesse uma guerra aberta entre os EUA e o Irã — pouco provável neste momento —, o que acarretaria uma alta permanente do petróleo, seria sábio deixar que seu novo preço exercesse a função básica de alterar o comportamento dos consumidores, inclusive em relação a bens que ficariam mais caros com a elevação dos fretes e o uso do petróleo em outros produtos.

O governo poderia extrair lições das intervenções do Banco Central (BC) no mercado de câmbio. Quando o dólar sobe, o BC age apenas para reduzir a excessiva volatilidade, nunca para interferir no preço natural da moeda. Essa ação, relativamente simples e instantânea, é exercida via um grupo reduzido de instituições financeiras. Nada a ver com a complexidade que caracterizaria a operação de um fundo para intervir no preço dos combustíveis. Por tudo isso, o governo faria bem se desistisse da ideia, a qual, de resto, provavelmente não tem paralelo em outros países.

Publicado em VEJA de 29 de janeiro de 2020, edição nº 2671



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